quinta-feira, 15 de maio de 2014

Não é fácil escrever um poema



Como o mar que se vaza em marés, para depois se expressar nas ondas do pensamento, assim me sinto, redopiando palavras para escrever um poema.

Coloco a mente em desvario procurando o verbo que descreva o sentimento. E deve ser ímpar, para fazer nascer um verso novo, solto como o vento.

Sabes meu filho, isto de escrever tem muito que se lhe sinta, se não sentires, mais vale correres para não seres apanhado pelo pensamento.

E não te ponhas a empurrar a emoção magoada, com tântricas palavras ocas, que acomodem teus olhos às lágrimas da comoção ultrapassada.

Mais vale perguntares ao amor intermitente ou à dor permanente se te podem ajudar na tua derradeira expressão. Porque não é fácil escrever um poema.  

Oxalá fosse tão fácil escrever sobre as minhas viagens ao mundo das transcendências interiores, do juízo que se rasga num pensamento falso e corriqueiro.

Como a chuva que cai em solo morto e nada brota, mais vale deixar para a mórbida memória estas silabas rasgadas de paixão.

Quem dera que um copo de tinto emprenhado com prazer pelo sentimento, parisse um poema desnudado da dor literária.

Que esta caneta de traço azul poético, se manifestasse autónoma neste palco de papel, numa dança grafológica emocional.

Quem dera que a razão e a lógica descansassem na praia do imaginário para gozarem as ondas do imenso oceano gramatical.

Oxalá a lua descesse lá do alto do meu telhado e me segredasse ao ouvido os mantras literários do eterno poema transcendental.

Quem dera meu filho que cada pergunta tua resultasse em escrita narrada, sobre o instante sentimental entre a vida e morte, que ora é verso, ora é prosa.

Quem dera não escrever penado um sentimento, e que sentimento não houvesse, para não ter de o escrever num poema.

© Altino Pinheiro

14.05.2014

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