sábado, 19 de outubro de 2013

A trova da cabra do porco e do povo


Avisado está o leitor
Esta história acaba mal
Não pela falta de rigor
Mas pelo insólito final

Era uma vez uma cabra
Igual as outras então
Parece coisa macabra
A chiba pariu um leitão

Ficou chocada a freguesia
Com tamanha situação                                      
Na vida nunca um dia
Uma cabra pariu marrão

Coisa bizarra e anormal                                     
Ai jesus quem me acode
Nasce do ato sexual
Entre a cabra e o bode

Fosse só esta a historia
Que o pior está para vir
Terá o leitão sua glória
Vai a vida o sorrir?

Cresceu em tamanho e idade
O nosso ilustre suíno
E foi na universidade
Que se formou em cretino

Arrogante rigoroso
Consagrado analítico
Alcoviteiro famoso
Um promissor politico

Prometeu apoio social
Educação sem estrovo
Saúde essencial
O melhor para o povo

Mas o povo para o porco
Eram belmiros e martins
O resto canetas em orco
Riscando nuns  boletins

O povo que não é porco
Nem filho da uma cabra
Não mata a fome do corpo
Com o ar e uma sabra

Foi o povo em alvorada
A casa da cabra então
Fizeram dela caldeirada
Comeram com satisfação

Á tardinha desse dia
Foram todos em conjunto
Com a panela vazia
Fatiar o rico presunto

Escutem lá o passado  
Ele tem sempre razão
Acaba cozido ou assado
Todo o político marrão  

Prestem bem atenção
A história faz-se assim
Até os donos da nação  
Podem um dia ter fim

© Altino Pinheiro


quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Arco-Íris


Há um arco íris de mil cores exuberantes lá no fundo deste horizonte universal que abraça a possibilidade da esperança.  São texturas que se renovam na quietude de uma palavra graciosa, num gesto de bondade que pode ser a verdade. Na beleza desta confortante planície futura, sinto um Deus gracioso que me exorta a respirar a confiança deste ar mágico e puro.  

Há um arco íris equilibrado que se curva em plena consciência para unir em segurança os seus extremos; objetivo, subjetivo, construindo assim a preciosa personalidade eterna.  A meta do incessante movimento, asas de colibri esvoaçando no tic tac do tempo. Metamorfose que resplandece a alegria de me transformar simplesmente.

Há um arco íris lindo que revela o segredo, o santo gral merecido, prometido pelas almas unificadas em mim, testemunhas das pedras estilhaçadas que rasgaram o meu corpo no percurso deste caminho consumado em aposta. O jogo é um ganho, o esforço é um sorriso que se aposta com a vida na aventura do ser.


Há sempre um arco íris que te espera lá no fundo da possibilidade, prometido em motivação pelo hoje e que vai colorir de sonhos o teu amanhã.    

© Altino Pinheiro
             

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Poliedro



Se existe coisa dolorosa para mim é precisamente “mexericar” o passado, abrir o baú da memória para certificar-me que existem pedaços incompletos de mim. Sou uma estrutura que se faz com o tempo, que se vai compondo com o presente, evitando o recurso a peças que não se encaixam num puzzle que se quer contemporâneo. No entanto nesta arriscada viagem de regresso ao passado, podemos sempre desencantar tesouros perdidos no amontoado de acasos que julgávamos perdidos. Há 30 anos atrás tive a honra de participar num projeto literário do jornal Açoriano Oriental intitulado Poliedro. Autores anónimos, ou não, partilhavam quinzenalmente, aos domingos, o que lhes ia na alma através da escrita, em prosa e poesia. Um página inteira de cultura que agora é ocupada pelos índices dos mercados financeiros, analises politicas e outras que não sendo cultura, também cultivam. Expressava-me como adolescente, riscando tintas coloridas em papel de diários e cadernos, testemunhos físicos das emoções que em todo o momento poderiam ser revistos. Adorava o meu diário!

Um poliedro é uma figura geométrica cuja a superfície é composta por um número finito de faces e tal como os sentimentos possui vértices e arestas… Para se definir, rever e aceitar as emoções torna-se necessário recuamos lá atrás, ao baú do tempo e limparmos o pó das causas, estender os planos definidos pelas suas faces até se intersectarem, formando assim uma nova figura. E isto em geometria chama-se; Estrelamento. 

© Altino Pinheiro


domingo, 6 de outubro de 2013

Aqui na feira



Aqui na feira é a sorte quem manda.
Nada é mais certo do que o leve desapego
Um lugar de muitas gentes e muitas coisas
Queridas, abandonadas ao tempo de uma recordação
Bancas de lembranças fugidas de outrora
Pechinchas sentimentais vendidas ao desbarato
Aqui na feira somos os melancólicos ricos da realidade  
Poderosos, neoliberais dos trapos e fatos.
Marxistas do alecrim, das moedas falidas do passado
Vibrantes cantantes, gritantes; - Bom e barato
Empáticos feirantes, pedintes; - Paga um, leva dois

Vendem-se recordações empoeiradas, discos, ceroulas e loiças
Abunda a arte nostálgica, sapatos, quadros e chás
Sábios escritos antigos, traquitanas, licores e sabões

Compram-se sorrisos verdadeiros, jeans, jogos e jarras
Dão-se promessas de qualidade, rádios, ferramentas e relógios
Trocam-se baluartes de amizade, casacos, camisas e beijos
Uma roda comunitária de vida sem fim
Abarcada no valor do preço mais justo

Aqui na feira é sempre assim…

© Altino Pinheiro

sábado, 5 de outubro de 2013

Madrugada




Desperta o meu corpo dorido de uma noite mal dormida, pesadelo de insónia persistente que persegue-me todas a noites.
É já madrugada, julgam os meus olhos pela cor da noite adormecida.
Abro aos poucos as cortinas da manhã ensonada que se anuncia em 6 badaladas lá da torre da matriz, quase mudas, distantes.

Observo, escuto o magno silencio desta madrugada melódica que se repete magicamente todos os dias num circulo perdido. Brado ao céu uma inspiração oxigenada que me desperta da minha quietude, do sono pasmado. O que vejo é belo. Divinas névoas boreais juntando a noite ao dia num véu doirado de reflexo solar. Contemplo o sol que nasce sem pressa num clarão divino de luz celestial, por de trás do algodão de nuvens cinzas matinais.

Abraço o meu olhar para os lados desta janela de madrugada, exalando um sorriso interno de gratidão. E vejo a lua quase cheia ainda acordada, seguindo em compromisso a noite apressada. Algumas estrelas difusas teimam em testemunhar esta beleza universal, piscando uma lágrima de um choro enfraquecido, soluçado.

Soprado pela brisa fresca um bando de pombos vai matizando as tintas deste quadro cósmico, rasgando a seda do imenso azul-turquesa, derramando vermelhos vivos, melados, ensanguentado pelos dias que fizeram o passado.
Acordo decididamente do sono perdido, não concedido pela noite, para adormecer acordado neste sonho emprestado pela madrugada.

© Altino Pinheiro










quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Lembrança de Mãe



Agora me lembro mãe
Das tuas lágrimas que se fizeram águas
Mornas, maternas que me trouxeram num parto
Do teu beijo sagrado, sofrido
Das palavras, dos verbos e atos
Do choro, da chuva, do ralhar

Quase me esqueci, mãe
Do sorriso abandonado ao pão                               
Teu sacrifício acusado de amor
Esforçado numa alegria tão frágil
Num silêncio cheio de vida
Tua vitória contada em história
Escrita em suor no livro em branco

Agora sei, mãe
Como se faz um filho
Dos que sentem, dos que amam.
Como se nasce, como se morre.

© Altino Pinheiro




quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Meu pai sentido em 1982 e 2010


Aos treze anos escrevia umas coisas que sorrateiramente chamava de poemas. Todos temos necessidade de nos expressar, projetar as nossas necessidades, sentimentos e emoções. Na escrita ficamos resguardados da iminente traição da linguagem, que por vezes nos oferece palavras que não desejamos, vazias de sentimento. Na escrita não existe o impulso compulsivo de resposta por aquilo que se sente no momento. Posso expressar diferentemente um determinado assunto por palavras, gestos, linguagem e a sua perceção ser alterada com o contexto. Na escrita, independentemente do método utilizado, o sentimento é sempre único e verdadeiro. Prevalece no tempo e no espaço. 



Anjo meu Pai


Abro a janela
Da minha memória
Brisa leve de saudade
De olhos fechados
Vejo-te aqui, meu Anjo
Sempre perto de mim
Sinto teu sopro
Apontas sinais
E por vezes me dizes
Estou aqui !

Abro os meus olhos
E olho nos teus
Profundos que são
Revelam a certeza
De que tu meu pai
Não tiveste um fim
Abro os meus olhos
E acredito que afinal;
Tu vives em mim.




19,03,10

© Altino Pinheiro